Fazia muito frio. Omolu amedrontava-me, matutando sobre além das cortinas. Gota de suor que não escorreu escorreram, sombra no lençol. É aqui mesmo? O artista que tira a roupa na minha frente merece partilhar da minha atenção. Ver antes (ante conceber ver). Ver. Apenas. Com o fascínio da Crescente. Fazia frio naquele lugar. Havia palmeiras também. E uns cinco ou seis ou oito marginais iludiam. Uma escada, uma queda, uma fonte, um pinguinho de sangue - até que nem tanto sutil assim. No chão os semi-deuses diziam o que não se podia dizer. Seus movimentos mortos, orgásticos, pré-epicuristas. Dos corpos amorfos jorrava uma cólera distinta. Meninos muito bem apessoados e de belo porte. Meninos sujos. Meninas também. E punhais embalados com esmero num vermelho cetim. Cada um com o seu canhão apontado para a testa e para o outro. Luz. Mais luz. Malditos anjos góticos. O todo em fricção, gemendo de prazer, zombando nossa cara de babaca. Derramaram os leites maus. Os bons também. Derramaram, derramaram, verteram com seus xaxarás, varreram Eguns e espetaram o canto da minha cutícula com um lasca bem fina de carvalho - seria orvalho? Coisas assim vivi enquanto cremavam-me pacientemente com requintes de crueldade, de ilusão, ao som de "Like a virgin" - acidental? Quem de mim morreu? Qual pai, qual mãe, qual nada! Puta, santa... alguma coisa foi por água abaixo. Em que porão, frigobar, corda de náilon, brazilian culture, escondi o corpo que matei? Mato gente. Confesso que me apraz. Georgette em Medéia, Odilon em Saul, Ranieri nele mesmo, Maria em Bethânia, Elis Regina atrás da porta, Fellini em Palhaços, Danilo em Cliptemnestra, Glória Swasnor em Crepúsculo, Caetano em Transa, a puta que o pariu, caio em mim, a Banda Hamlet. Todos apagando depois do aplauso final. Alma de artista que parte. A Banda Hamlet é o movimento do repertório. A Banda Hamlet é bafo! (Tietagem). Fazia frio naquele bar. E gente pela galeria, bastante gente. E uma gente maluca bêbada também tinha, tomando Jack. Perguntei se era alcóolico. Estava longe; estávamos. Lembrei de Fernanda, au hasard, lembrei de Paulinho, de Marina, de Vento Doce, de Lilica, de gente que eu queria que estivesse ali, sabe? Encontrei a Carla, blasé. Vi um troço branco se mexendo - Zé Celso, pensei - no fundo com aquelas luzes brancas, jorravam luzes brancas de tudo que era lado, do meu ventre, do externo, cristas ilíacas e o sujeito atrás queria mais um viva para a cultura brasileira, viva! Eu vi a banda passar. Uma alusão ao contínuo se sobrepondo, articulando. Instrumentos, alegorias, festivais (onde está o espetáculo?). Para além do campo da pura fruição estética, o palco do Teatro Oficina privilegiava o desnudar das relações, suas dimensões concretas, simbólicas e indagações absurdas frente à vida, eu vi a banda passar. Perplexidade era meu nome. Bonito era meu nome. E uma maluca bêbada, tomando Jack do meu lado (detesto gente que assovia quando gosta muito). A gente está se conhecendo, coração - bet you'll never get to! Porra! Tem arte pra se fazer todo dia todo dia quando eu chego e saio e socorro e durmo e quando passo café. Tem arte no chuveiro do Galpão, na Paulista tem arte e no Feijão, escovando os dentes, no telefonema que eu não dei, na minha extensão. Ars pra sobreviver, pra ir além Ars, pra metamorfosear, pra Waly, Ars. Pra ficar Odara, pra ficar Odara, pra ficar! É por causa da Banda Hamlet. Deu vontade de viver pra caralho! De acordar às quatro pegá bóia e í pro mato. Deu vontade de carpir até sangrar a mão no canavial e usar metáforas extremistas pra dizer o quanto eu gostei do que vi, com o cio chegando, calor. Leve a semente. Vida: questão de talento. Evoé! (Pausa)
Eu vi a banda passar.
terça-feira, 17 de agosto de 2010
sábado, 14 de agosto de 2010
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
minueto
Detesto gente que escreve pra desabafar. God! Ainda mais agora que todo babaca tem acesso banda larga à informação e pode ser dono de qualquer best-seller. Detesto best-sellers, detesto gente que escreve coisas em blog, detesto gente que escreve para desabafar, detesto perder chances, perder coisas, detesto, detesto. Outro dia a pessoa teve o desbunde de divulgar seu "cantinho literário virtual" na traseira do carro, pode? Vomitei. Devo estar febrio, perdoe a ira, devo estar. Mas ira é vida Clarice e detesto gente que se demora lendo frases na parede. Paredes brancas, pinto todas, rabisco, escrevo, esqueço coisas da memória, detesto. Uma parte minha vai deixando pedaços pra trás; ru-pes-tre. Festas acontecem sempre no outro apartamento. Acontecimentos, acontecimentos, acontecimento. É a segunda vez que olho pra cima e me vem o cuspe no meio da testa e eles riem, riem em silêncio da cena. Se sou ou não capaz de bem interpretar does not matter. Por isso não admito perder horários, viagens, maravilhas. Detesto gente que chega em cima da hora, detesto. Por que sempre a sobra? O resto. Do resíduo já puseram banquete e eu quero falar da alta chama. Do momento antes da glória, de quando tudo ainda é fracasso e o sujeito, mesmo assim, continua porque tem fé, porque acredita, porque se conhece. 28.744.442-9 registro geral. Ando com fé? Mário, quero chorar e rasgar e destruir quem brilha mais. É treze - eu não acredito nisto. Destesto desabafo. Detesto gente que tem liberdade nostálgica para cuspir amarguras através disto. Detesto blogues, me tirem daqui. Me internem. Saem borboletas da minha cabeça, André não me ama mais, o tempo seca. Estou com febre devo estar. E venta. O que mudou? "Quando Saul estava indo embora, começou a chorar. Sem saber ao certo o que fazia Saul estendeu a mão, e quando percebeu seus dedos tinham tocado a barba crescida de Raul. Sem tempo para compreenderem, abraçaram-se fortemente. E tão próximos ficaram que um podia sentir o cheiro do outro: o de Raul, flor murcha, gaveta fechada; o de Saul, colônia de barba, talco. Durou muito tempo. A mão de Saul tocava a barba de Raul, que passava os dedos pelos caracóis miúdos do cabelo do outro. Não diziam nada. No silêncio era possível ouvir uma torneira pingando longe. Tanto tempo durou aquilo que, quando Saul levou a mão ao cinzeiro, o cigarro era apenas uma longa cinza que ele esmagou sem compreender." O que mudou?
P.S.: Com exceção de Fellini, detesto palhaços.
P.S.: Com exceção de Fellini, detesto palhaços.
domingo, 8 de agosto de 2010
+ leminski
"Ser poeta é ter nascido com um erro de programação genética que faz com que, em lugar de você usar as palavras pra apresentar o sentido delas, você se compraz em ficar mostrando como elas são bonitas, têm um rabinho gostoso, são um tesão de palavra".
sábado, 7 de agosto de 2010
domingo, 1 de agosto de 2010
quinta-feira, 29 de julho de 2010
quarta-feira, 28 de julho de 2010
l-ira
Sampã putinha severa suave veneno - me piquei.
Na tua aldeia quase três cabeça heavy transe pirei.
(Let it be! Let it be!)
Socorro, tô sentindo quase tudo,
Socorro, eu preciso respirar.
Eu ser pelado pela orla ou pela orla pelado andar -
Não gosto.
(Je ne veux pas traveiller).
Minha pele do braço derrete,
o cara tira o tênis,
muito sol,
sinal
Todos os ácaros brazileiros entupidos no ar atmosferado,
- Ha! Ha! Ha!
Riso de bixa solta pelo ar.
Mais riso de bixa,
bala de bixa,
tom de voz de veado,
detesto veados.
Materiais para contrução.
Todo mundo já sabe que eu não sou daqui, né, vaca?
EU BICHO GRILO E VOCÊ SECA DEMAIS SAMPÃ MEU BEM.
tIvE qUe BOtAr A mÁsCaRa.
sorry não aguentei.
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiii
sinta o barato de todos os tempos comEGO, baby.
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiii
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiii
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiii
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiiiOMMMMMMMM}.
sinta o barato de todos os tempos comigo baby.
Na tua aldeia quase três cabeça heavy transe pirei.
(Let it be! Let it be!)
Socorro, tô sentindo quase tudo,
Socorro, eu preciso respirar.
Eu ser pelado pela orla ou pela orla pelado andar -
Não gosto.
(Je ne veux pas traveiller).
Minha pele do braço derrete,
o cara tira o tênis,
muito sol,
sinal
Todos os ácaros brazileiros entupidos no ar atmosferado,
- Ha! Ha! Ha!
Riso de bixa solta pelo ar.
Mais riso de bixa,
bala de bixa,
tom de voz de veado,
detesto veados.
Materiais para contrução.
Todo mundo já sabe que eu não sou daqui, né, vaca?
EU BICHO GRILO E VOCÊ SECA DEMAIS SAMPÃ MEU BEM.
tIvE qUe BOtAr A mÁsCaRa.
sorry não aguentei.
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiii
sinta o barato de todos os tempos comEGO, baby.
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiii
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiii
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiii
têmpora {bull bull bull}
mente {lalahitastorliuknumeeeeeezzzziiiiiOMMMMMMMM}.
sinta o barato de todos os tempos comigo baby.
terça-feira, 27 de julho de 2010
incortázar
"Mas, como sempre, estavam sozinhos na ilha e o cadáver de olhos abertos era a única coisa nova entre eles e o mar."
quarta-feira, 7 de julho de 2010
Minha flor,
Quem deve ser eu e aonde deve estar você? Hoje faz vinte anos que você embarcou. Tanto tempo, eu sei. Acordei com pedaços de letras tuas saltitando na boca e ainda ontem espalhei pelo tapete da sala momentos que passaram por nós; resíduos. Acho meio melancólico quando dito assim e sei que você é avesso a esse saudosismo cafona, a essa melaina cole, como você dizia, soprando a fumaça pra cima e revirando os olhos, seu rayban, tão blasé. Gosto especialmente quando você diz "Palavra que eu sou bom. Ah! Eu sou tão!". A gente tem essa coisa infeliz de filho único. Essa necessidade draconiana de provar pro mundo o quanto a gente vale a pena. Parece uma tentativa frustrada de recuperar o olho materno que não mais voltará porque agora quem nos cuida é o mundo. E você é bom, cherié. Somos. Daí cantei logo de manhãzinha, passando café, antes de sair, bem humilde - você adoraria ver. Fiz todas as mini-tarefas matinais que você nunca compreendeu ou questionou como aquele sabonete especial para a pele oleosa que recém desperta, a faixa azul clarinha que prende os cabelos para que a espuma do sabonete especial não encoste nos cabelos especiais, o alongamento ainda com o estomago vazio para estimular os sete chakras e todo aquele ritual meio bicha demais que te permitia ficar mais duas horas na cama para acordar, belo, always after noon, tomando baldes de café e com a cara melhor que a minha. Comi mamão, granola e mel. Fui até o tapete, recolhi nossos embrulhos, serpentes, migalhas, tragos, bilhetinhos azuis, garranchos, cabelos, pontas de cigarro, raspas, tapas na cara, restos, tantas coisas. Porque ontem andei espalhando cacos nossos por todos os cantos e fui ficando down. Tudo era amor. Levantei. O Rio estava claro demais, com uma bruma envolvendo a estratosfera, cobrindo de leve a inútil paisagem. Faria sol. Fez. Uma onda de calor e insanidade baixavam no ar. Aquele bafo quente, epifânico, que sopra lá daquele canto depois do Arpoador. E me vi, chutando a água, correndo atrás de você, possesso, que tinha me roubado o último cigarro porque não queria que eu fumasse frente aquele paraíso perigoso e porque certamente a gente ia encontrar a Cintia - aquela chata do sol, ascendente e lua em Virgo, pode? - pelo Nove e você tinha que estar fumando porque imagina se ela pensa que você anda saudável, tomando sol pelas manhãs, suco de caixinha sem açúcar e sundown, meu bem? Imagina! E queimou a minha mão pra arrancar o cigarro de mim e amarfanhar no bolso pra depois. Varamos a noite bebendo, rodando de bar em bar e lembro que naquele dia parece que Urano estava entrando em Escorpião - ou alguma coisa assim -, que a Milgris estava explicando antes de você posar de star e quase quebrar o dedo do Caetano, que tinha me abraçado curtamente, sem sufoco. Chafurdamos no Baixo, cem gramas, sem dramas, todas as últimas doses e notas possíveis e queríamos, loucas e saudáveis, caminhar à beira do mar enquanto duelávamos a ponta. Sinto falta do mar. Sinto falta do mar com você. Não gosto de sentir sua falta. Não quero, de forma alguma, que você pense que eu faço a viúva saudosista nem a guerreira. Não choro, nem reclamo abrigo - mentiras sinceras, dirão os irônicos. E quando a saudade enlouquece recorro a um de seus videos - gosto de te ver em movimento. Ai! Por que que a gente é assim, hein? Hoje é quarta. Dia de comer aquela torta de banana com chocolate que você pirava. Não desci, nem comi. Fui ficando meio mal humorado sem muitos motivos nem vontade. Fui me fechando em mim, estava um saco. Ranzinza, ilhado, desprezando Bette Davis. Deu vontade de te beijar, jogar uma rosa branca pra ti no mar - qual é a cor do amor? Arrumei a mala, desci, comprei sete rosas brancas e lembrei daquele teu show, quando o Zeca jogou um copo no palco e você pisou descalço. Antes de sair fui ler e-mails. Parei. A foto de Zeca na página principal, desacreditei. Como é que pode? Vocês dois, aviadores malucos, se trombando nesse trem? Me arrepiei, juro. Puseram aquela foto que você vestia a camiseta branca do Bloco que minha mãe tinha trazido de Recife e ele com aquela camisa roxa que a cachorra tinha comido os botões, lembra? Foi no Canecão, depois do teu show, que você disse que nunca ia deixar ele em paz. Daqui até a eternidade! Vida louca! Decidi passar na banca de flores novamente e comprar mais sete. Amarelas porque Zeca era de Oxum e já tinham as brancas que eram tuas. Queria que elas se misturassem no azul. Que coincidência, meu deus, é o amor! Anjos e fadas existem, eu sei. E seguem estrelas. Que os senhores deuses nos protejam. Não te direi adeus porque a vida é desprevenida e exata. Adeus é tempo demais. Quarta feira. O menino triste quer ser um herói.
R.
Quem deve ser eu e aonde deve estar você? Hoje faz vinte anos que você embarcou. Tanto tempo, eu sei. Acordei com pedaços de letras tuas saltitando na boca e ainda ontem espalhei pelo tapete da sala momentos que passaram por nós; resíduos. Acho meio melancólico quando dito assim e sei que você é avesso a esse saudosismo cafona, a essa melaina cole, como você dizia, soprando a fumaça pra cima e revirando os olhos, seu rayban, tão blasé. Gosto especialmente quando você diz "Palavra que eu sou bom. Ah! Eu sou tão!". A gente tem essa coisa infeliz de filho único. Essa necessidade draconiana de provar pro mundo o quanto a gente vale a pena. Parece uma tentativa frustrada de recuperar o olho materno que não mais voltará porque agora quem nos cuida é o mundo. E você é bom, cherié. Somos. Daí cantei logo de manhãzinha, passando café, antes de sair, bem humilde - você adoraria ver. Fiz todas as mini-tarefas matinais que você nunca compreendeu ou questionou como aquele sabonete especial para a pele oleosa que recém desperta, a faixa azul clarinha que prende os cabelos para que a espuma do sabonete especial não encoste nos cabelos especiais, o alongamento ainda com o estomago vazio para estimular os sete chakras e todo aquele ritual meio bicha demais que te permitia ficar mais duas horas na cama para acordar, belo, always after noon, tomando baldes de café e com a cara melhor que a minha. Comi mamão, granola e mel. Fui até o tapete, recolhi nossos embrulhos, serpentes, migalhas, tragos, bilhetinhos azuis, garranchos, cabelos, pontas de cigarro, raspas, tapas na cara, restos, tantas coisas. Porque ontem andei espalhando cacos nossos por todos os cantos e fui ficando down. Tudo era amor. Levantei. O Rio estava claro demais, com uma bruma envolvendo a estratosfera, cobrindo de leve a inútil paisagem. Faria sol. Fez. Uma onda de calor e insanidade baixavam no ar. Aquele bafo quente, epifânico, que sopra lá daquele canto depois do Arpoador. E me vi, chutando a água, correndo atrás de você, possesso, que tinha me roubado o último cigarro porque não queria que eu fumasse frente aquele paraíso perigoso e porque certamente a gente ia encontrar a Cintia - aquela chata do sol, ascendente e lua em Virgo, pode? - pelo Nove e você tinha que estar fumando porque imagina se ela pensa que você anda saudável, tomando sol pelas manhãs, suco de caixinha sem açúcar e sundown, meu bem? Imagina! E queimou a minha mão pra arrancar o cigarro de mim e amarfanhar no bolso pra depois. Varamos a noite bebendo, rodando de bar em bar e lembro que naquele dia parece que Urano estava entrando em Escorpião - ou alguma coisa assim -, que a Milgris estava explicando antes de você posar de star e quase quebrar o dedo do Caetano, que tinha me abraçado curtamente, sem sufoco. Chafurdamos no Baixo, cem gramas, sem dramas, todas as últimas doses e notas possíveis e queríamos, loucas e saudáveis, caminhar à beira do mar enquanto duelávamos a ponta. Sinto falta do mar. Sinto falta do mar com você. Não gosto de sentir sua falta. Não quero, de forma alguma, que você pense que eu faço a viúva saudosista nem a guerreira. Não choro, nem reclamo abrigo - mentiras sinceras, dirão os irônicos. E quando a saudade enlouquece recorro a um de seus videos - gosto de te ver em movimento. Ai! Por que que a gente é assim, hein? Hoje é quarta. Dia de comer aquela torta de banana com chocolate que você pirava. Não desci, nem comi. Fui ficando meio mal humorado sem muitos motivos nem vontade. Fui me fechando em mim, estava um saco. Ranzinza, ilhado, desprezando Bette Davis. Deu vontade de te beijar, jogar uma rosa branca pra ti no mar - qual é a cor do amor? Arrumei a mala, desci, comprei sete rosas brancas e lembrei daquele teu show, quando o Zeca jogou um copo no palco e você pisou descalço. Antes de sair fui ler e-mails. Parei. A foto de Zeca na página principal, desacreditei. Como é que pode? Vocês dois, aviadores malucos, se trombando nesse trem? Me arrepiei, juro. Puseram aquela foto que você vestia a camiseta branca do Bloco que minha mãe tinha trazido de Recife e ele com aquela camisa roxa que a cachorra tinha comido os botões, lembra? Foi no Canecão, depois do teu show, que você disse que nunca ia deixar ele em paz. Daqui até a eternidade! Vida louca! Decidi passar na banca de flores novamente e comprar mais sete. Amarelas porque Zeca era de Oxum e já tinham as brancas que eram tuas. Queria que elas se misturassem no azul. Que coincidência, meu deus, é o amor! Anjos e fadas existem, eu sei. E seguem estrelas. Que os senhores deuses nos protejam. Não te direi adeus porque a vida é desprevenida e exata. Adeus é tempo demais. Quarta feira. O menino triste quer ser um herói.
R.
domingo, 4 de julho de 2010
sábado, 3 de julho de 2010
1
"Tinha terminado, então. Porque a gente, alguma coisa dentro da gente, sempre sabe exatamente quando termina - ela repetiu olhando-se bem nos olhos, em frente ao espelho. Ou quando começa: certo susto na boca do estômago. Como o carrinho da montanha-russa, naquele momento lá no alto, justo antes de despencar em direção. Em direção a quê? Depois de subidas e descidas, em direção àquele insustentável ponto seco de agora."
na asa do vento
A lua é clara
O sol tem rastro vermelho
Onde os dois vão se mirar
Rosa amarela quando murcha
Perde o cheiro
O amor é bamdoleiro
Pode inté custar dinheiro
É flor que não tem cheiro
E todo mundo quer cheirar
Todo mundo quer cheirar
Oi, lá, rá, viu
Todo mundo quer cheirar
Todo mundo quer cheirar
Oi, lá, rá, tá
Todo mundo quer cheirar
O sol tem rastro vermelho
Onde os dois vão se mirar
Rosa amarela quando murcha
Perde o cheiro
O amor é bamdoleiro
Pode inté custar dinheiro
É flor que não tem cheiro
E todo mundo quer cheirar
Todo mundo quer cheirar
Oi, lá, rá, viu
Todo mundo quer cheirar
Todo mundo quer cheirar
Oi, lá, rá, tá
Todo mundo quer cheirar
quarta-feira, 23 de junho de 2010
segunda-feira, 21 de junho de 2010
terça-feira, 15 de junho de 2010
segunda-feira, 14 de junho de 2010
inútil micro-prosa para quem anda tão perto
Porque se não há coragem, que não se entre. É melhor permanecer na superfície, a mesma que quiseste deixar para outra página. Curioso como a gente se trai nas mínimas pausas, nos não ditos, no que se perdeu na fimbria das sinapses confusas e congeladas do mês. As pessoas querem pouco, e o que é pior, em doses homeopáticas. Preciso reaprender este jogo urgentemente. ("All in" é assim que se diz?) Não é o teu silencio, nem a tua alma fugidia, nem tuas palavras que me trouxeram. É porque enxergo a mulher que se esconde por detrás de tantos véus. Rabisco olhos nos olhos, açúcares e afetos, trocando em miúdos: sem fantasia. Bobagem, eu sei. Talvez nem tão mulher assim, talvez nem tão homem também. É esse teu indelével ascendente em peixes. Cuidado com as ilusões, mocinha, profundas como o fundo do mar. Os bichos quando temem exalam um odor de compaixão que impunemente paralisa o predador. Um tiro de misericórdia, um grito suspenso no ar. (Ouves?) Não sou dado a compaixão. Os filhos únicos são seres mesquinhos. Sinto que te afundas e minha fome cada vez aumenta mais. Sei que marco. Permaneço, atormento, disconecto, aturdo, impulsiono, fascino, desperto.
Por aqui tudo bem, baby. Nothing at all. Um avião passa, o sol não aquece, não ouço nada demais. Feliz aniversário. (Pausa. O telefone toca). Não foi engano. Eu já sabia que não era você.
Por aqui tudo bem, baby. Nothing at all. Um avião passa, o sol não aquece, não ouço nada demais. Feliz aniversário. (Pausa. O telefone toca). Não foi engano. Eu já sabia que não era você.
quarta-feira, 9 de junho de 2010
atentado
- Porque o que esqueceram de te contar, garotinha, é que as coisas são bem maiores do que o tamanho dos teus chapéus. O mundo está cansado de enxergar a miséria e quem, me diga, quem você acha que apraz com as tuas palavras? Engraçado. Quando eu tinha a tua idade também julgava ser a criatura mais miserável do mundo. Vagava pelas noites escrevendo à velas, escarafunchava no mais fundo de mim, na mais profunda dor e achava que esta era a única condição que a literatura me impunha: o sofrimento. Quando a gente tem essa idade essencial é a atenção. A rebeldia, o rompimento, a transgressão, o ódio. Tem gente que acha que o renascimento advém da dor. E hoje me pergunto: pra quê? É isso que vejo nos textos teus. Honestamente, não me agradam. E nem tinham que me agradar. Bobagem é querer conquistar alguém com palavras. A voz que lê jamais saberá das pausas, do não dito, da cadência, nem das mãos que escrevem. Tesão a gente resolve é na cama. Por isso não quero teus sonetos, nem tuas elegias, nem tuas odes, nem nenhuma palavra tua. Quero o teu silêncio. Melhor: quero o teu gemido. É nele que mora o teu encanto. No sub-texto, no fundo escuro, na curva imprecisa do teu pescoço. Tua coxa se entreabrindo, minha mão certeira. Quero paredes, palpites, armários, rastros, hormônios. Quero vermelhos pecados profanos. Línguas e dentes. Destruição e barbárie. Vês? Falo com as mesmas letras que insistes em utilizar para elevar a dor. Cada qual com seu monólogo, eu sei. Mas por que, menina, não aprendes a conviver com o prazer? Tão bom selar-te com meus pelos; minhas pegadas de jovem leão. Navegar, navegar, navegar em teu corpo é quente. Conservado pelo vinho, pelo desejo. (Ah! El deseo). Minha cara, deixe esse romantismo de lado, é tão demodé! A melancolia não embaralha os lençóis nem deixa cicatrizes. Lembra-te daquele velho Aerosmith, dos nossos jeans rasgados, da ponta, da poça de vinho tinto no tapete e da água. Lembra-te de como sorvemos um ao outro, serpentes, umedecendo os lábios e nos fartando de uma carne que ali sim provamos bundamente. Pra que buscar o eterno no perecível? Amor eterno é papo de anjo. É enfadonho, lírico demais. As grades que existem nos teus entornos precisam de um grito de libertação e eu não o darei. Mas...repara naquelas mulheres. Aquelas que desconhecem Adele H., Camille Claudel, nem nunca sequer tocaram na capa de um Nietzsche, aquelas mulheres que não sobem nem descem a Rua, de porões e saltos, de Dreyer na mão e fósforos, estas sim, certamente, podem servir de aliadas para o teu ano novo quântico que já se anuncia. Bobagem te dizer tudo isso, eu sei. Cada qual com seus truques. É porque me vejo em você. Não é saudosismo, é pura vaidade. Quero me metamorfosear nessa fonte que avista a gilhotina. Quero o corte, o risco. Por isso abuse, meu bem. Tire essa dor do peito, dispa-se e mande teu corpo me visitar. São 1h53 da manhã. Em São Paulo faz frio, 13º na Avenida Paulista, bebi um pouco demais. Talvez por isso, quem sabe, talvez por isso queira tanto me atirar.
sábado, 22 de maio de 2010
quinta-feira, 20 de maio de 2010
WANTED
Alice me deixou. Era exatamente 23h12min quando Alice, sem dizer palavra, levantou-se num impulso do sofá, largou o que ainda restava no copo de conhaque sob a mesa do canto e partiu sem dizer. Vestia uma calça jeans, que deixava seu corpo longilíneo, uma bata branca sem botões com uma pequena mancha de café na manga esquerda e seus velhos tênis gastos. Ventava, chovia. Os trovões eram os mais altos que já ouvira e caíam próximos. Ninguém se levantou para fechar as janelas. Chovia dentro do apartamento. Alguma coisa aconteceu no céu antes da tempestade.
sábado, 15 de maio de 2010
quarta-feira, 12 de maio de 2010
quarta-feira, 28 de abril de 2010
um conto para um povo de nenhum lugar

[Para ler ao som de "É doce morrer no mar", na versão de Monica Salmaso]
No dia em que ele não veio eu fiquei a madrugada rezando baixo pro mar. Era lua cheia, farol, vela hasteada. Noite alta naquele deserto de sal. Trova de pescador, batuque de sereia, um rosário de dor. Nem sei dizer bem certo, seu moço, como é que eu fiquei. A gente não tem tempo pra servir o diabo porque tem é muito ponto pra juntar. Varava os olhos por aquele fundo poço e pensava que devia ser fácil se perder com tanta onda. Tanta coisa já ouvi de homem que virou noivo de Iemanjá... Mas homem do mar era o meu e forte! Tal qual Guriatã! Por isso mesmo, sem dar muita trela pra pensamento solto e já não tendo como escapar, atinava que homem feito ele não havia de servir de oferenda pra rainha do mar.
No dia em que ele não veio eu fiquei a madrugada rezando baixo pro mar. Era lua cheia, farol, vela hasteada. Noite alta naquele deserto de sal. Trova de pescador, batuque de sereia, um rosário de dor. Nem sei dizer bem certo, seu moço, como é que eu fiquei. A gente não tem tempo pra servir o diabo porque tem é muito ponto pra juntar. Varava os olhos por aquele fundo poço e pensava que devia ser fácil se perder com tanta onda. Tanta coisa já ouvi de homem que virou noivo de Iemanjá... Mas homem do mar era o meu e forte! Tal qual Guriatã! Por isso mesmo, sem dar muita trela pra pensamento solto e já não tendo como escapar, atinava que homem feito ele não havia de servir de oferenda pra rainha do mar.
Por que, minha mãe? Por que - eu replicava com a boca cheia de sal - a senhora havia de levar meu homem pro teu sobrado e me deixar aqui plantada sozinha nesse mangue seco de dor? Eu não tinha mais peito pra. Mulher de pescador vai se acostumando a ficar. Tem mais é que remendar a rede, tirar miúdo de peixe e acender o fogo pra queimar. Falta é tempo pra se lastimar. Mas eu sabia, por Nosso Senhor eu queria saber, que aquele caboclo que não era mais meu alguma hora havia de reluzir no fundo mais escuro, faceiro, com o saveiro cheio, apontando pra mim o que havia trazido do lado de lá. É... Eu sabia que ele vinha, porque meu homem era também um pouco dono de toda aquela imensidão. Se perde, mas se acha logo, que nem tábua de maré. E então me apertaria naquele cheiro pesado de maresia e eu nem ia mais saber o que era choro meu o que era sobra de mar. Eu sou é feita de espera, já disse, seu moço. Tem mais jeito, não. Longa noite longa. Foi quando subi os olhos e já tonta avistei de longe o corpo dele no escuro se aproximar. Qual nêgo mais forte que o meu era capaz de não voltar? Eu sabia, eu sabia! Agô, mãe d'água! Odoyá! Veio vindo vagaroso, de dias que não via o chão de terra pra pisar, de baque virado no pau seco da canoa, da falta d'eu, que sabia que tão logo havia de sentir. E, de bem pouco em pouco, de bem pouco em pouco, de bem pouco, fui me dando conta de que aquele que vinha vindo era homem meu, não. Aquele que vinha vindo era homem nenhum. Era onda vazia, nem canoa havia, nem sombra de pescador, nem repuxo de mar. Era homem meu, não. Lá tinha nada. Era só Exu traído que peça queria me pregar.
No dia em que ele não veio triste noite foi pra mim. E saí então a procurar. De que valia a terra ali fincada sem o braço do meu homem? De que valiam as contas, as paineiras, o Abaeté e os ijexás? É doce morrer no mar, sabia. Amargo era viver assim. Ossanha predadora levou meu homem de mim agora tinha também que me levar. Era o que podia fazer. (A mulher é agora uma compacta e uma leve e uma aguda alegria fatal.) É doce morrer no mar - avançando sob as águas do mundo pelo meio; é doce morrer - escorrendo toda sobre os olhos salgados que ardem; é doce - o mar por dentro como um líquido espesso de homem que não vai mais voltar.
No dia em que ele não veio triste noite foi pra mim. E saí então a procurar. De que valia a terra ali fincada sem o braço do meu homem? De que valiam as contas, as paineiras, o Abaeté e os ijexás? É doce morrer no mar, sabia. Amargo era viver assim. Ossanha predadora levou meu homem de mim agora tinha também que me levar. Era o que podia fazer. (A mulher é agora uma compacta e uma leve e uma aguda alegria fatal.) É doce morrer no mar - avançando sob as águas do mundo pelo meio; é doce morrer - escorrendo toda sobre os olhos salgados que ardem; é doce - o mar por dentro como um líquido espesso de homem que não vai mais voltar.
[Foto: Brisa Chander.]
sexta-feira, 23 de abril de 2010
domingo, 11 de abril de 2010
segunda-feira, 5 de abril de 2010
terça-feira, 30 de março de 2010
Sobre P.
Ando preocupado com P. Há três dias não dá notícia, nem sequer atende meus telefonemas.
Andei pensando que talvez ele tivesse sucumbido de vez a tudo que chamamos real. Ele é um cara muito sensível. Hoje em dia é cada vez mais difícil encontrar pessoas sensíveis. Elas
andam meio em extinção, sabe como? P. é intenso demais. Sempre em busca da insustentável
leveza. Sempre em busca de algo que nem sei se ele sabe bem ao certo o que é, mas sempre em
busca. Outro dia disse pra ele que o fato de morar sozinho talvez o deixasse ainda mais
solitário. Ele concordou. Disse que achava quase todas as pessoas desinteressantes e
previsíveis. Que sentia que o amor não era pra ele, que sentia que havia como uma sina, um
fardo, um linha traçada fixamente que pre-determinava sua condição de
jovem-triste-e-solitário-porém-cheio-de-talento. Achei triste. Mas acho de uma sabedoria e
humildade incríveis. Da última vez que nos encontramos ele falou-me de alguns textos que
havia escrito. Sempre falava muito bem de seus textos, gostava do que escrevia. Talvez fosse
este o único horizonte onde se realizava e sabia que o fazia bem. Quando cantava também.
Cantando P. deixava de ser aquele "nature boy" e tornava-se no que bem entendesse. Ontem,
pediu-me para apagar as luzes e cantou como nunca tinha ouvido antes. Ao final perguntei-lhe
o que havia acontecido, ele riu, deixou o violão de canto, tomou um pouco d'água e acendeu
um cigarro, mudando de assunto, gostando de azul.
Pedro é blue, cheio de saudade. É difícil manter uma relação estável com ele. Por isso acho
que ele vive tanto sozinho. Espero que esteja bem. E que encontre - seja lá onde, seja lá - o que há anos vem tateando no escuro.(Pausa)Cadê?
Andei pensando que talvez ele tivesse sucumbido de vez a tudo que chamamos real. Ele é um cara muito sensível. Hoje em dia é cada vez mais difícil encontrar pessoas sensíveis. Elas
andam meio em extinção, sabe como? P. é intenso demais. Sempre em busca da insustentável
leveza. Sempre em busca de algo que nem sei se ele sabe bem ao certo o que é, mas sempre em
busca. Outro dia disse pra ele que o fato de morar sozinho talvez o deixasse ainda mais
solitário. Ele concordou. Disse que achava quase todas as pessoas desinteressantes e
previsíveis. Que sentia que o amor não era pra ele, que sentia que havia como uma sina, um
fardo, um linha traçada fixamente que pre-determinava sua condição de
jovem-triste-e-solitário-porém-cheio-de-talento. Achei triste. Mas acho de uma sabedoria e
humildade incríveis. Da última vez que nos encontramos ele falou-me de alguns textos que
havia escrito. Sempre falava muito bem de seus textos, gostava do que escrevia. Talvez fosse
este o único horizonte onde se realizava e sabia que o fazia bem. Quando cantava também.
Cantando P. deixava de ser aquele "nature boy" e tornava-se no que bem entendesse. Ontem,
pediu-me para apagar as luzes e cantou como nunca tinha ouvido antes. Ao final perguntei-lhe
o que havia acontecido, ele riu, deixou o violão de canto, tomou um pouco d'água e acendeu
um cigarro, mudando de assunto, gostando de azul.
Pedro é blue, cheio de saudade. É difícil manter uma relação estável com ele. Por isso acho
que ele vive tanto sozinho. Espero que esteja bem. E que encontre - seja lá onde, seja lá - o que há anos vem tateando no escuro.(Pausa)Cadê?
sábado, 20 de março de 2010
quarta-feira, 17 de março de 2010
segunda-feira, 1 de março de 2010
Cecília
"Me escutas, Cecília?
Mas eu te chamava em silêncio.
Na tua presença
Palavras são brutas."
[Buarque].
Mas eu te chamava em silêncio.
Na tua presença
Palavras são brutas."
[Buarque].
quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010
quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010
domingo, 21 de fevereiro de 2010
pára-brisa
Deixai-me enlouquecer.
Que a tua ausência transparece em cada ponto, em cada fuga, em cada canto.
Deixa-me transparecer.
Que a tua presença enlouquece cada ponta, cada fogo, cada conto.
Quê fazer? Eco que não cansa em soar.
Deixai transpirar, enlouquecer, reaparecer em cada oco e roto e louco pranto meu.
Deixai suar. Deixar só. Deixai ser.
Que a tua ausência transparece em cada ponto, em cada fuga, em cada canto.
Deixa-me transparecer.
Que a tua presença enlouquece cada ponta, cada fogo, cada conto.
Quê fazer? Eco que não cansa em soar.
Deixai transpirar, enlouquecer, reaparecer em cada oco e roto e louco pranto meu.
Deixai suar. Deixar só. Deixai ser.
sábado, 20 de fevereiro de 2010
"E tanto tempo terá passado, depois, que tudo se tornará cotidiano e a minha ausência não terá nenhuma importância. Serei apenas memória, alívio, enquanto agora sou uma planta carnívora exigindo a cada dia uma gota de sangue para manter-se viva. Você rasga devagar o seu pulso com as unhas para que eu possa beber. Mas um dia será demasiado esforço, excessiva dor, e você esquecerá como se esquece um compromisso sem muita importância. Uma fruta mordida apodrecendo em silêncio no quarto."
Caio F.
quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010
Sê tu a palavra
1.
Sê tu a palavra,
branca rosa brava.
2.
Só o desejo é matinal.
3.
Poupar o coração
é permitir à morte
coroar-se de alegria.
4.
Morre
de ter ousado
na água amar o fogo.
5.
Beber-te a sede e partir
- eu sou de tão longe.
6.
Da chama à espada
o caminho é solitário.
7.
Que me quereis,
se me não dais
o que é tão meu?
[Eugênio de Andrade].
Sê tu a palavra,
branca rosa brava.
2.
Só o desejo é matinal.
3.
Poupar o coração
é permitir à morte
coroar-se de alegria.
4.
Morre
de ter ousado
na água amar o fogo.
5.
Beber-te a sede e partir
- eu sou de tão longe.
6.
Da chama à espada
o caminho é solitário.
7.
Que me quereis,
se me não dais
o que é tão meu?
[Eugênio de Andrade].
domingo, 7 de fevereiro de 2010
no calcanhar dos minutos, na sombra do pôr do sol, na sobra de mim

pensei em você era quase três da manhã quando pensei em você não isso não é verdade era dia claro quando pensei em você estendi as mãos em volta ainda com os olhos fechados tateando às escuras não havia nada ninguém fui comprar jornal sei que gostas de ler notícias pela manhã comprei pão também e leite passei um café forte abri as janelas para que o ar do novo dia nos saudasse doce brisa e me coloquei à porta do quarto feito um gato ansioso à espera do dono era quase meio dia quando pensei novamente em você sei porque me deu aquela tontura destes dias quentes ai as geleiras ai a camada de ozônio ai onde é que isso tudo vai parar meu deus sei que você me entende sei que ri também e não sei se devido à tontura mais uma vez subindo os dezessete andares fui atravessado pelo rastro imperdoável do teu perfume e pensei em você nada nada pensei em você no meio da tarde quando desejei louco uma rede faixa de mar infinito água de beber balançaríamos os dois príncipes bundos brancas pombas a vadiar na areia e eu sei que você me pediria qualquer coisa no violão quem sabe um samba antigo e passarímos a vida assim no centro do universo você deitaria no meu ombro ou eu no seu tanto faz e sentiríamos que tudo aquilo valia a pena sim e então foi me dando uma saudade inconsolável um desespero torto de quem desaprendeu como se pede algo à alguém aguardava respostas no fim da tarde quando os automóveis buzinavam e as filas não andavam e os ônibus lotados não me deixavam outra alternativa a não ser continuar pensando em você afinal era início de tarde e quem sabe uma very-happy-hour-baby quem sabe um sorvete suco de abacaxi com a hortelã que eu plantei no quintal quem sabe tudo em qualquer esquina casual quando nos olharíamos aliviados e nos abraçaríamos e caminharíamos contando de nossos dias nossas vontades nossas fomes estaríamos famintos os dois e sairíamos sem presssa ilesos ao caos lá de fora o universo suspenso para que pudéssemos nos escutar sem gritos entrelaçados e quase fim do dia tantos filmes tantos shows tanta vida buscaríamos bares simpáticos e aconchegantes ou arrumaríamos as malas e nos mandaríamos para Luanda pois à noite me invadem os dragões vorazes as pulsões e já era quase nove dez onze da noite quando pensei em você estava exausto liguei o rádio e "I know that's the way" fui apagando uma sede vezenquando me dá uma sede secular de eram quase três da manhã você sabe e pensei pensei pensei pensei pensei pensei pensei pensei pensei pensei pensei pensei com afeto em você.
[Foto: Chander, Brisa].
sábado, 6 de fevereiro de 2010
domingo, 31 de janeiro de 2010
domingo, 24 de janeiro de 2010
"E esta ânsia de viver, que nada acalma,
E a chama da tua alma a esbrasear
As apagadas cinzas da minha alma!"
Então sentou-se na sala vazia. Os pensamentos tombavam seu tronco para trás e persistiam-lhe
aquelas idéias de perdas, desencontros, evolução. Era como uma incapacidade de alçançar
o umbral da vida ou o precipício. Cego estava e, sem tato, varava por parques inabitados a procura de. Que falava demais, gesticulando, dramática atriz. Que brindava a vida, que contava histórias, que lançava-se no sem volta a me perturbar. Em cada partícula de tempo se despedindo e voltando sem saber.
Contava dos mundos, fumava, sorrindo tossia. Das poltronas, das lojas, das latas enormes de
chá, da pulverização tecnológica em massa, da polidez dos costumes, da maternidade, da marginalidade, da fórmula matemática, da transcendencia, do bairro gay, do confinamento, do congelamento, das suas entranhas, estátuas, pústulas, fatias de bolo, fatais becos sem saída. Em cada moldura sua uma parte minha se apagava. E não entendia porquê. Fui me perdendo aos poucos. Quadro a quadro. E ela voltava a me encontrar.
Porque eu só tinha silêncios e ouvia seus gritos. Tive vontade de. Ela dançava na minha frente. Não sei se me convidava. Alguma coisa me estancava ali,prostrado, imobilizado, fragil e atento. Recebendo seu alimento bruto através de um tubo diretamente ligado ao meu segundo chakra, ou terceiro, não sei bem. Aquele que se relaciona com as suas experiências passadas, com o seu vir a ser. Meu ponto de partida, marco zero. Eu me lambuzava em seu líquido jocoso porque tinha sede. Fechava os olhos, passeava por todos os lugares, me perdia, me perdia, me perdia. E ela me achava. Nos meu porões, abismos, calabouços. Chovia.
Me angustiava. Porque eu queria mais. Precisamente não saberia dizer o quê. Mas admirava
aquela instalação multi-dimensional onde ela habitava. Qual seria a senha? A tal palavra
mágica. Como pertencer a esse lugar inexistente e ao mesmo tempo tão próximo de mim? Era
como se eu tivesse vivido até então como quem olha o mundo através de uma janela com grades
de um apartamento dos fundos. Palavras não descreviam a alegria até então desconhecida
surgida de um (re) encontro. Então chorei pela falta silenciosamente. Molhado por dentro sem
vestígios de lamento nem dor. Não sentia mais nada. Repousava triste, em silêncio. Não sei se comigo foi sempre assim. Mas naquele sábado, naquela noite, eu tinha muito o que lhe contar.
sábado, 16 de janeiro de 2010
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