sábado, 13 de junho de 2009

paroxítona

E eu te pronunciava pausadamente, segunda sílaba, o telefone tocou.
Não foi engano.
Eu sabia que não era você.
Vírgula que separa o eu de mim do eu do outro.
Que segue a linha, que tange o ventre, que tinge de cinza o breu.
Na mesma, na mesma, na mesma.
Dos olhos,
da língua minha
mingua a vírgula.
Não quero pontos, quero vírgulas, vê?
Quero porque quero porque ouso querer você.
Não, não quero.
Quero o que há de mim aí onde há você, bem aí onde ousa haver você.
Não, não a você.
A mim, a minha.
Deixa, deixa.
Só falo porque tinha que.
Ai.
Deixa que eu seja hoje somente mesa,

domingo, 7 de junho de 2009

les dragons ne connaissent pás le paradis.


É.

Definitivamente, les dragons ne connaissent pás le paradis.

Ou os dragões não conhecem o paraíso.

As coisas permaneciam ali, vermelhas, rosas, ramos de alecrim e hortelã pendurados no sopé das portas para que desse sorte, muita sorte, sete vezes sempre pra dar sorte.

Os corpos permaneciam ali, linhas verticais, em apenas três cantos preenchidos - o quarto vazio estava.

Toma um gole de vinho tira a tua camisa passa a tua mão fria no meu cabelo que pinica a tua mão que deixa de estar fria pra se enfiar dentro do meu bolso pegar isqueiro ousar queimar tua solidão teu desespero teus abismos e eu dizendo que não enquanto segurava firme a taça do vinho que lentamente tomei naquele sábado meu deus meia noite no meio daquela rua onde algum cachorro como sempre latia latia latia latia latia e disparava alarmes internos e eu te dizendo que tudo estava bem coração deve ser só o leiteiro lá fora e tu ias te acalmando assim quando tirei um raminho de hortelã do bolso esquerdo do paletó o bolso do coração e eu te acalmava e eu te embalava e eu te dizia que.

Aquela mulher, aquela melodia reminiscente, aquele ruminar de folhas, aquela casa.

As esquinas do dia de ontem coreografaram-se tão bem! Que nem me importei em negar teu café do novo dia, nem tua sopa velha sabe-se-lá-de-quando e nem me importei por ter sido o único a não compartilhar de teu brinde e tua saúde e meus decorrentes sete anos que viriam sem.

Nada mais. Os dragões não conhecem, os dragões não se importam, os dragões não querem saber.

Uma imagem: o corpo da atriz içando-se ao canto esquerdo da sala.

Uma imagem: o corpo da atriz numa catapulta, o esquerdo da sala e seus olhos, seu corpo todo, seus tortos fios de cabelo, suas vermelhas unhas de pés tão brancos, seus trapos unidos, enquanto ela inteira me dizia em uníssono que ele havia chegado, mas não, não, era só um engano e tudo bem, tudo bem. Dorme, meu filho, dorme. Só existe o sonho.

terça-feira, 2 de junho de 2009

fragmentos- retalhos

- Mamãe, como se faz pra colar um espelho?
- Não é possível.
- Mas nunca mais?
- Não sei. Você já tentou Durepox?
- Sim, mamãe.
- E?
- Nada. As partes não se colam.
- Sei.
- Parece um batalhão de mim espatifado.
- Parece o quê?
- Não quero ser fragmento, mamãe.
- E cola quente, você já tentou?
- Também. Parece um caleidoscópio.
- Parece o quê?
- O pior é que comecei a acreditar que.
- Sei.
- E não sei qual deles sou eu.
- Você já tentou aquelas fitas dupla-face de alta resistência?
- Sim, mamãe.
- E?
- Nada. As partes não se colam.
- Tente maizena.
- Qual deles é seu filho, mamãe?
- Como?
- Qual-destes-reflexos-é-o-seu-filho?
- O que estiver inteiro?
- A gente só é quando está inteiro?
- Esqueça isso.
- Mas não é possível colar um espelho?
- Não, não é possível.
- Tente.
- O quê?
- Colar.
- Afinal de contas, meu filho, do que você está falando?
- Das pequenas partes do todo que refletem o nada. E dos múltiplos sóis que se formaram na varanda de Maria.
- Não é a varanda de Maria, é banheiro do seu quarto.
- Tempestades solares.
- Você já tentou goma? Sei lá.
- Sim. As partes não querem mais se colar.
- Meu filho...
- Sim?
- Você já tentou haxixe?
- Ainda não, mamãe. Talvez prefira Super-Bonder.

segunda-feira, 1 de junho de 2009



Sucesso
Observe as ondas no oceano. Quanto mais alto a onda sobe, mais fundo é o sulco que a segue. Em um momento, você é a onda, no outro, você é o sulco que se forma atrás. Aproveite ambos - não fique apegado apenas a um deles. Não diga: "Eu gostaria de estar sempre no auge!" Isso não é possível. Encare simplesmente o facto: não é possível. Isso nunca aconteceu, e nunca irá acontecer. É simplesmente impossível - não faz parte da natureza das coisas. Então, o que se pode fazer?Desfrute o pico enquanto ele durar, e depois desfrute o vale, quando ele vier. O que há de errado com o vale? O que há de mal em estar em baixa? É um relaxamento. O pico é uma excitação e ninguém pode viver o tempo todo em estado de excitação.

Comentário:

Este personagem, obviamente, está, neste momento, "cavaleiro do mundo", e todos estão celebrando o seu sucesso com uma chuva de papel picado. Devido à sua disposição para aceitar os recentes desafios da vida, neste momento, você está - ou logo estará - desfrutando de uma maravilhosa cavalgada sobre o tigre do sucesso. Receba bem essa oportunidade, desfrute-a, compartilhe a sua alegria com os outros - e lembre-se de que todas as brilhantes paradas têm um começo e um fim. Mantendo isso em mente, se você extrair cada gota de sumo da felicidade que está experienciando neste momento, será capaz, depois, de aceitar o futuro da forma como vier, sem arrependimentos. Não seja, porém, tentado a agarrar-se a este momento de abundância, ou a acondicioná-lo em plástico para que dure para sempre. A maior sabedoria para ter em mente à medida que vão desfilando os acontecimentos da sua vida, sejam momentos de alta ou de baixa, é que "isto também passará". Celebre sim, e continue a cavalgar o tigre.